Prisão
Nesta
cidade
quatro
mulheres estão no cárcere.
Apenas
quatro.
Uma
na cela que dá para o rio,
outra
na cela que dá para o monte,
outra
na cela que dá para a igreja
e
a última na do cemitério
ali
embaixo.
Apenas
quatro.
Quarenta
mulheres noutra cidade,
quarenta,
ao menos,
estão
no cárcere.
Dez
voltadas para as espumas,
dez
para a lua movediça,
dez
para pedras sem resposta,
dez
para espelhos enganosos.
Em
celas de ar, de água, de vidro
estão
presas quarenta mulheres,
quarenta
ao menos, naquela cidade.
Quatrocentas
mulheres,
quatrocentas,
digo, estão presas:
cem
por ódio, cem por amor,
cem
por orgulho, cem por desprezo
em
celas de ferro, em celas de fogo,
em
celas sem ferro nem fogo, somente
de
dor e silêncio,
quatrocentas
mulheres, numa outra cidade,
quatrocentas,
digo, estão presas.
Quatro
mil mulheres, no cárcere,
e
quatro milhões – e já nem sei a conta,
em
lugares que ninguém sabe,
estão
presas, estão para sempre
– sem janela e sem esperança,
umas
voltadas para o presente,
outras
para o passado, e as outras
para
o futuro, e o resto – o resto,
sem
futuro, passado ou presente,
presas
em prisão giratória,
presas
em delírio, na sombra,
presas
por outros e por si mesmas,
tão
presas que ninguém as solta,
e
nem o rubro galo do sol
nem
a andorinha azul da lua
podem
levar qualquer recado
à
prisão por onde as mulheres
se
convertem em sal e muro.
(Cecília
Meireles, 1973, v.7, p.149-50)
Fonte:
MEIRELES, Cecília. Prisão. In: Darcy Damasceno (Org.). Poesias completas. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira; Brasília: INL, 1973. 8v.
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